quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

- E assim foi. A Anita tirou uma corda da mochila e aconteceu ...
Naquele momento Pedro não se aguenta e começa a chorar. Por fim tinha contado tudo. Sentia-se mais leve e fraco. Quem tinha sido ele que nem foi capaz de salvar a pessoa de quem gostava? Que amor era aquele? Não sabia o que ia acontecer a seguir mas de uma coisa tinha a certeza, nunca ia esquecer Anita. Nunca ia esquecer a forma como ela a fazia sorrir, os momentos que passavam os dois. As brincadeiras que tinham ou a forma como ela lhe chamava de "tosco". Sempre lhe dizia que podia se ajeitar mais mas no fundo sabia que gostava dela assim, daquele jeito tímido, "betinho", que não dava nas vistas. Adorava tudo nela e tinha percebido isso tarde demais. Sabia que ela tinha um grande futuro pela frente e naquela hora pediu que aquele futuro ainda fosse com ele. Gostava de lhe ter dito que precisava dela, dos momentos com ela, que a queria. Amava o sorriso dela, o jeito desengonçado com que soltava uma gargalhada. Adorava ainda mais a forma como ela o fazia sorrir. Sabia que aquilo que ele amava mesmo nela era a pessoa em que ele se tornava quando estava com ela. Lembrou-se da ultimas frases da carta que ela lhe deixou:


"Eu apaixonei-me por ti, pela forma como eu me conseguia reflectir em ti. Por aquilo em que tu te conseguias tornar quando estavas comigo. Pela forma como eu conseguia fazer isso. Pela forma como os teus olhos se enchiam de luz quando eu te surpreendia ou da forma como tu te enchias de luz quando te fixavas em mim e olhavas para a Anita verdadeira que eu era contigo. Nunca me disseste mas não precisei. A mulher tem esse jeito de saber quando um homem gosta dela e eu sei que tu gostavas de mim tanto como eu gostava de ti."

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

- Eu não sabia o que ia fazer para a ajudar. Esperei que ela se acalmasse. Fomos comer qualquer coisa e levei-a a casa. Ela tentou enganar os pais, disse que já tinha comido comigo e que estava com imensos trabalhos para fazer. No dia a seguir foi o dia em que tudo aconteceu. Ela chegou a minha beira de manhã e disse que tinha uma solução para tudo. Ficamos de nos encontrar no fim das aulas a beira do mato da casa dela, o sitio onde nos encontrávamos sempre os dois.
- Porquê no fim das aulas? - perguntava António.
- Acho que a Anita já tinha tudo planeado. Se eu e ela faltássemos as aulas depois a policia e mesmo vocês iam concluir que estávamos juntos e ela não queria isso. Cheguei ao mato e já estava ela. Estava sentada no chão com uma carta na mão e chorava imenso. Eu nunca tinha conhecido a Anita assim e aquilo mexia muito comigo. Perguntei-lhe como é que íamos resolver as coisas e ela começou a falar: "- Eu estive a pensar e só vejo esta solução. Vou matar-me Pedro. Eu não quero dar esta desilusão aos meus, eu já não tenho futuro assim. E descobrir que eles não são meus pais? Então quem são? Porque é que me mentiram? Vivi sempre numa mentira e isso magoa tanto saber. Doí-me tanto o coração Pedro e não consigo parar de chorar. Sempre fui tudo aquilo que eles quiseram. Eles porque não são mais que sim. Nem sei o que me são. Estranhos. Escrevi uma carta para eles mas quero que a guardes tudo. No dia em que fizer um ano que morri e isto tudo já tiver esquecido quero que a entregues mas de uma forma a que eles não percebam que estiveste comigo. Depois tenho uma  carta na mochila para ti.Quero que a leias quando estiveres sozinho. Eu amo-te e quero que saibas disso. Quero-te pedir que isto seja o nosso pacto. Quero que me prometas que mais ninguém vai saber disto. Ninguém Pedro. Quero que estejas aqui porque me dás força e segurança."

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

- A Anita descobriu que estava grávida e nessa altura entrou em desespero. Não sabia como contar aos pais nem o que fazer. Eu próprio entrei. Como é que eu vos ia dizer isso? Como é que vocês iam ficar? E os meus estudos? Eu disse-lhe para irmos ao centro de saúde mas ela tinha imenso medo que os pais depois descobrissem e ia ser pior. Os dias foram passando e nós não sabíamos como fazer as coisas até que um dia ...
- Sim Pedro, um dia? - perguntava António em forma de fazer continuar Pedro com as afirmações.
- Até que um dia a Anita me ligou a chorar para ir ter com ela. Eu fui e quando cheguei a beira dela nem a conhecia. Só chorava e não se percebia nada do que ela dizia. Ela tinha ouvido uma conversa entre os pais de que era adoptada.
Elisabete ficou em choque. Conhecia os pais de Anita, eram amigos a imenso tempo e nunca pensou tal coisa. Como é que era possível? António da mesma forma ficou. Já não tinha certezas se conseguia continuar a ouvir a história.
- Eu fiquei pasmado. Não sabia o que lhe dizer e ela só chorava. Estava grávida, não queria dizer aos pais porque pensava que os ia desiludir e depois descobre que afinal não eram pais dela. Como ia ela viver depois? Vocês sabem como era Anita. Tinha tudo, era a menina perfeita. Aquilo tudo acontecer-lhe era mexerem demais com o mundo dela.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

- Podes começar Pedro. - declarou António com o olhar fixado em Pedro.
- Eu e a Anita andávamos juntos ás escondidas. Quer dizer não era bem andar, estávamos juntos de vez em quando ...
- Como assim estarem juntos de vez em quando? - interrompeu Elisabete.
- Sim mãe estarmos juntos, mas não tínhamos nada assumido como namorados. Deixa-me continuar e não me interrompas. Deixa-me dizer as coisas. Pode ser?
- Sim, continua. - afirmava António a sentar-se na poltrona mais perto de si, aquela informação tinha mexido com ele.
- Andávamos juntos à mais de um ano, desde aquele baile em que fui par dela. Estávamos juntos a jantar e depois chamaram os pares para dançar. Eu e a Anita fomos. Não sei como tudo aconteceu mas houve um beijo. No fim da noite eu trouxe-a a casa e beijamos-nos outra vez e a partir dai tudo começou. Tudo se foi desenvolvendo entre nós e semanas antes de Anita fazer o que fez descobriu que estava grávida.
- Grávida? - gritou Elisabete.
Aquela informação já era de mais para ela. Com o mesmo pensamento de António sentou-se a beira de Pedro. Tudo que Pedro lhe dizia caia como uma bomba para ela. Namorados e Grávida, o que viria a seguir?
- Mãe disseste que não me interrompias.
- Elisabete deixa-o acabar, fazes as perguntas depois.

domingo, 5 de janeiro de 2014

Dentro do carro o ambiente era de pesado. Pairavam muitos segredos e descobria o primeiro que iria ter coragem para falar.
- Pedro vais ter que contar essa historia muito direitinha quando chegarmos a casa.
- Eu sei mãe.
Nos últimos dias já se começava a tornar um hábito as acelerações nas estradas. Os transtornos contínuos que a morte de Anita tinha causado levava a que toda a gente vivesse com as emoções a flor da pele. Elisabete estava muito nervosa e queria o quanto antes chegar a casa. Já Pedro preferia eternizar aquela viagem, não sabia o que lhe esperava e ainda não tinha uma ideia formulada na cabeça de como iria contar tudo. Como seria de esperar, dado que o ponteiro do velocímetro não saia dos 100 km/h em 7 minutos lá estavam eles a entrar em casa. Apesar de tudo a rotina não mudara. A mochila de Pedro era largada no chão, a mala de Elisabete pousada nos cabides à beira e o casaco do mesmo modo. Encaminharam-se para a sala. Elisabete sentou-se e pediu um acto igual por parte de Pedro. Pedro sentou-se.
- Já liguei ao teu pai. Ele deve estar a chegar por isso vamos esperar.
Elisabete tinha razão. Ao fim de 3 minutos já se ouvia um barulho a chegar de um carro lá fora. Elisabete como por impulso lança-se para a janela. Era António. Abre-lhe a porta e dava-se o inicio de mais uma rotina. O casaco no cabide e os papeis e chaves pousados em cima de uma pequena mesa de apoio ao hall de entrada. Seguiram os dois para a sala e lá estava tudo reunido. Pedro sentado no sofá de 3 lugares a sentir-se a criança pequena que em tempos fora pronta a ouvir dos seus pais por ter roubado doces na loja do lado, e Elisabete e António, que como pais que eram amavam o seu pai mais que tudo e nada lhes fazia prever aquilo. Mas aquela situação era muito mais grave que um roubo de doces ou uma falta na escola. Era uma morte e Pedro tinha assistido a tudo.

sábado, 4 de janeiro de 2014

Levantou-se e saiu. Em casa sabia que lhe esperava uma tempestade. Pegou no telemóvel e ligou para a central de táxis ao qual lhe atendeu uma senhora diferente da ultima vez. Pediu um táxi e esperou. Reparou que nunca lhe tinha passado pela cabeça que aquele numero lhe viria a ser tão útil,mas de muito lhe ajudou nestes últimos dias. No meio de todos os pensamentos irreflectidos parou um carro em frente. Não era o táxi. Mais uma vez se voltava a encontrar com Ricardo.
- Aqui mais uma vez Pedro?
A forma descontraída com que o cumprimentou demonstrou que ainda não sabia do que se tinha passado naquela manhã o que por sinal deixou Pedro mais descansado para a hipótese de as autoridades já saberem também da situação.
- Vim falar com Anita mas já me vou .. - enquanto Pedro dava a sua explicação foi intercedido por mais uma chegada de outro carro. Mais uma vez não era o seu táxi mas sim a sua mãe. Reparando no semblante carregado com que saiu do carro, Pedro concluiu que a mãe já saberia de tudo.
- Olá Ricardo. Pedro entra no carro temos que falar.
- Olá Elisabete. Que se passou? Não sejas dura com ele. Ele só estava aqui a falar comigo e veio visitar a Anita.
- Nada, tenho só umas coisas da escola que falar com ele. Está tudo bem contigo? Sabes que tens uma casa inteira à tua disposição e da Joana. Temos sentido muito a vossa falta eu e o António.
- Um dia Elisabete.
- Adeus Ricardo e cuida de ti, de certeza que Anita não gostaria de te ver assim. Ela gostava imenso de ti e acima de tudo tinha muito orgulho.
Com uma despedida de dois beijos e um longo abraço carinhoso entre amigos, Elisabete deslocou-se para o carro e deixou Ricardo a entrada do cemitério para mais uma visita à sua filha. 

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Demorou o seu tempo mas mais uma vez lá estava ele. Nunca pensou em tempos visitar tanto aquele sitio. Arrepiava-lhe olhar para todos aqueles pedaços de pedra e saber que provavelmente estariam pessoas debaixo da terra que naquele momento pisava. Olhou em frente e ao fundo já se conseguia avistar a mesma campa de há dias com umas novas rosas brancas. Contornado algumas que lhe atravessavam o caminho e seguindo um pouco mais a frente chegou. Voltou a ler "Anita Vaz Gomes". Sentou-se e respirou fundo mais uma vez.
- Quero que me desculpes mas vou dizer tudo. Hoje na escola no meio de uma grande discussão disse que te vi pendurada naquela corda e provavelmente a policia já sabe disso. Queria tanto mudar tudo que se passou entre nós. Nunca ficaste a saber o quanto gostava de ti. Sei que te obriguei a esconder o que se passava entre nós os dois de toda a gente mas na altura achava que era o melhor. Fui tão burro, tão burro. Gosto de ti. Nunca te dei o valor e só hoje é que consigo perceber isso. Sei que te magoei imenso e talvez nunca tenha sido merecedor do que sentiste por mim. Só queria ter sido mais forte para te ter conseguido impedir daquilo. Amo-te Anita e nunca vai existir ninguém como tu.